Nesses dias em que a raça humana esbraveja por todas as partes, na tentativa desesperada de salvar o Planeta Terra da sua própria avareza, recordo-me do saudoso botânico Walter Radamés Accorsi. Professor Emérito da ESALQ-USP ele foi o taquaritinguense mais piracicabano dos caipiracicabanos que tive o prazer de conhecer. Defensor ferrenho da fitoterapia, esse espirituoso mestre grafou: “a natureza é o laboratório natural mais perfeito que existe no planeta”.
Nos anos 1980 eu e o jornalista Paulo Sérgio Tomaziello convidamos o Doutor Accorsi para o programa que batizei de “À Toda Flora”; projeto sustentável de extensão acadêmica que produzimos e apresentamos no rádio piracicabano, no interior paulista.
Sempre me interessei por assuntos verdadeiramente socioambientais; etc. e tais. Isso tudo vem do berço. Bem antes de todo esse discurso em tons às vezes apocalípticos já me ensinavam lá em casa a não jogar lixo na rua, a apagar as luzes acesas desnecessariamente, a fechar a torneira enquanto se escova os dentes. Órfão de pai, vivi tempos escassos e obscuros. Não passei fome, mas senti fundo a dor da vontade de comer.
De pronto o nosso sabedor da flora universal aceitou o chamado. E todas às sextas-feiras cedo lá estava ele; uma inesgotável fonte ao microfone. Generosamente ensinou aos ouvintes a não misturarem princípios ativos. Falou sobre o poder das ‘plantas medicinais’; enfatizou a importância do alho para o sistema imunológico; enalteceu a força das propriedades benéficas do óleo de copaíba; romantizou acerca da fluidez e eficácia dos chás; reiterou o vigor do ipê-roxo no combate ao câncer. Transbordava de sua voz levemente rouca um altruísmo nato e raro. “Até água demais faz mal”, alertava-nos docemente.
Bem menos ‘instantâneas’ e mais ‘humanas’ eram as redações naquela época. O “À Toda Flora”, cuja plástica das vinhetas gravamos nas gigantes vozes de Benedito Hilário e Antônio Freitas, interagia via telefone com os ouvintes. WhatsApp? Ora, nem o tal do Fax era advento ainda. O Telex, sim, reinava no pedaço.
Contudo, entretanto, porém, todavia: o cumprimento da nossa missão se confirmou pleno quando recebemos uma carta de uma médica. Um emocionante relato no qual a nossa ouvinte dizia que toda sexta-feira parava o seu carro num trecho da Rodovia Anhanguera, de onde conseguia acompanhar todo o programa, antes de ir para o trabalho, na vizinha Campinas. O raio de transmissão da emissora não era tão potente assim.
O artista plástico Palmiro Romani definiu certa vez a morte como: ‘o eterno’. O “À Toda Flora” é hoje uma boa lembrança. O Doutor Accorsi já não está visível entre nós. Sabemos, então, que tudo sempre passa. Fica o eterno. O bem que fazemos neste mundo de Deus.