Órfão de pai hoje eu entendo quão importante foi descobrir-me prodígio na escola da vida a lapidar a minha índole ante o espelho das minhas imperfeições, a esculpir os meus talentos na solidão e a fortalecer o caráter no interminável exercício das diferenças além-fronteiras. Não me tome aqui como pretenso Santo, sei da minha condição de efêmero. Fosse o contrário seria provável que eu não iniciasse esta crônica dizendo, sem temor algum, da paúra que senti ao ver-me na oportunidade de escrevê-la. Bem, mas o frio na barriga ligeiro logo se foi, como tudo o mais passa rapidamente na vida. Então afinei os meus ouvidos às falas da alma entoadas em bom português pelo destemido Papa Francisco, em momentos de pura graça e generosidade durante a 28ª Jornada Mundial da Juventude Rio 2013. Diga-se, a língua portuguesa, graças a Ele, fez-se ouvir Brasil afora.
As circunstâncias da vida ensinam-nos incansavelmente que medos paralisam a gente. Aprendemos com o tempo que nada fácil é transformar boas informações em positivas ações. O caos social vivenciado diariamente em toda parte é retrato nítido da ação destrutiva do medo a assombrar toda a gente. Dicotomicamente somos nós que indistintamente o fabricamos. Então podemos afirmar, sem titubear, que o medo predomina se preterirmos a Fé – mãe da Verdade. E quase sempre isso acontece sob tristes pretextos de famas e ganhos instantâneos. E o que resulta da desonestidade e ganância é amaldiçoado, frutos de sementes de desgraças. Sucesso não significa fama, ao contrário, é resultado de trabalho realizado com amor e foco na prosperidade e posteridade comunitárias.
A indústria do crime e o regime de agiotagem legalizada que se instalou até mesmo nos povoados mais remotos desta e doutras nações é resultado do medo. O homem virou lobo de si. Medo é pai da inverdade, da covardia, das segundas intenções, da antiética, da blasfêmia, da calúnia, da difamação, da injúria, da corrupção política, da tirania. O medo é soberbo. Medo é Lúcifer tentando convencê-lo da sua incapacidade – e você a tudo é capaz. Ter apego a cargos e títulos é certamente cultura de medrosos. Olhar a vida pelo retrovisor ou tentar enxergá-la através de bolas de cristais são atitudes igualmente medrosas. Agindo assim deixamos de contemplar o agora e de viver plenamente o tempo e espaço ao redor.
O Papa Francisco veio ao Brasil num importante momento e as suas palavras ajudaram a despertar consciências, apesar de a Igreja Católica ainda relutar diante de preceitos arcaicos e preconceituosos. Creio que a mensagem maior do Santo Padre, do Rio de Janeiro para o mundo, foi lembrar-nos que somos todos peregrinos da Fé e que, sob a abóboda celeste devemos permanecer juntos e calcados no firmamento. Alertou que tecnologias nas pontas dos dedos perdem valia sem fabricadas e utilizadas sem sentimento. Incansável missionário, o Papa Francisco entusiasma e alegra. Lembrou-nos que somos indivíduos úteis ao mundo. Encorajou-nos a sermos verdadeiros instrumentos de paz, como ensinou São Francisco de Assis.
Reluzindo vitalidade aos 76 anos de idade, o simpático Papa Francisco claramente não tem medo do medo. “Sigam na contracorrente”, disse ele aos jovens. E acrescentou: “idosos também são o futuro”. Consciente de sua árida missão neste planeta repleto de contradições ele humildemente pediu: “Rezem por mim”.
Assim o farei, mas confesso que rezarei também para que tenhamos, a partir de agora, igrejas 24 horas com as portas abertas. Pois, mais do que relicários sacro-arquitetônicos, as Casas de Deus foram concebidas como recantos destinados a acolher corações aflitos.
“Deus nos chama a fazer escolhas e tem um propósito para cada um de nós”, preconizou o Papa Francisco.